quinta-feira, 7 de junho de 2012

Adecco (Guarda) - a (i)responsabilidade...

1. O desemprego é um flagelo por todo o país. É-o, ainda mais onde as empresas encerram e não há expetativas. Esta é a realidade laboral do interior. Com uma agricultura de subsistência, sem indústria, com o sector serviços cada vez mais debilitado, resta a função pública. Por todo o país são as câmaras e a administração pública quem vai assegurando a sobrevivência de famílias que teimam em ficar, que teimam em não partir para Lisboa, para o litoral ou… emigrar. Porque a emigração volta a ser o caminho, a opção, para quem quer “procurar” futuro. O comércio, no interior, mal sobrevive por falta de clientes; o êxodo generalizado, a fuga das nossas vilas e cidades, provoca uma agonia, uma decadência, a que só fogem os supermercados, os hipermercados, onde toda a gente compra tudo…

2. Em Portugal há cerca de 500 centros de contacto, informação e atendimento – vulgos “call center”. Estes empregadores apareceram em várias localidades como os redentores, criando emprego às centenas, aos milhares… Trabalho precário, de baixo salário, mas ainda assim de grande interesse, nomeadamente para a profissionalização de jovens recém-licenciados.
Em Seia, a EDP criou um “contact center” com 250 trabalhadores; em Castelo Branco, com a colaboração da câmara local, a Reditus criou em 2008 um “call center” com 360 postos de trabalho, que em 2009 ultrapassou os 400; na Covilhã, a Teleperformance, com a Vodafone, instalou-se contratando numa primeira fase, em 2008, 360 pessoas, no final de 2010 ultrapassou os 580 trabalhadores; na Guarda, em plena campanha eleitoral para as Autárquicas de 2009, a câmara tirou um coelho da cartola e apresentou a Adecco, que anunciou o investimento de 800 mil euros num projeto de instalação de um “call center” que iria empregar 250 pessoas…
A implementação do projeto na Guarda surpreendeu a todos os níveis. Apresentado por Joaquim Valente enquanto presidente da Câmara Municipal da Guarda, num ato em que se confundiu autarquia e campanha eleitoral do PS, num restaurante da cidade, anunciou-se a instalação da Adecco para o Parque da Cidade. Joaquim Valente assegurou então que a requalificação dos “pavilhões” iria custar 300 mil euros e que a autarquia iria recuperar esse dinheiro ao longo dos anos, em rendas, com carência nos dois primeiros anos. Cinco meses depois, em fevereiro de 2010, a Adecco começava a laborar nesse espaço «verdejante», como lhe chamaria com satisfação o presidente da Câmara, onde entretanto a autarquia tinha já enterrado não 300 mil mas, pelo menos, 450 mil euros, numas obras de que todos se sentiam muito orgulhosos, até porque ali começavam a trabalhar 25 pessoas, e todos os intervenientes asseguravam que até ao verão triplicariam, e em menos de dois anos cumprir-se-ia a promessa dos 250 postos de trabalho prometidos, «isto numa perspetiva cautelosa», diria então o responsável da empresa. Estranhamente, poucos meses depois, em Novembro, o “call center” da Adecco, já estava reduzido a 18 operadores. Hoje, está encerrado. Os poucos trabalhadores que ainda têm vínculo aguardam, em casa, de “férias”, que a Adecco os convoque para regressarem ao trabalho. A empresa não sabe quando é que isso acontecerá, pois depende de novos contratos. Supostamente, desde Fevereiro de 2012, que deveria estar a pagar renda, se bem que estranhamente nunca foi divulgado o valor a debitar mensalmente e que, a priori, permitiria amortizar o investimento realizado na adaptação das instalações. Ou seja, a Câmara da Guarda gastou quase meio milhão de euros em obras numas instalações que agora estão encerradas e que assim deverão continuar, para ajudar uma empresa que prometeu um dia criar 250 empregos, que nunca criou, e quase de certeza nunca irá criar. A autarquia tem a obrigação de, urgentemente, exigir responsabilidades à multinacional que não cumpriu os pressupostos do contrato. Tem obrigação de se justificar perante os cidadãos. E tem de ser responsabilizada por mais um negócio pernicioso e lesivo para os cofres da câmara, nocivo para as expetativas dos trabalhadores e prejudicial para a economia da cidade.


Luis Baptista-Martins
(O Interior)

(As partes seleccionadas a amarelo são da responsabilidade do autor do Blog)

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