quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Código do Trabalho - Proposta de Lei 216/X

Em Abril de 2008, o governo apresentou aos parceiros sociais um documento intitulado “Reforma das Leis Laborais”, que visava essencialmente alterar o Código do Trabalho.
As linhas de orientação que o governo apresentou foram apreciadas na Comissão Permanente de Concertação Social, até finais de Junho, acolhendo contributos dos vários parceiros sociais nessa fase de discussão.
Refira-se que em 2003, aquando do debate parlamentar sobre o actual Código do Trabalho, o PS apresentou 442 propostas de alteração, todas elas subscritas pelo actual titular do Ministério do Trabalho, para além de invocar a inconstitucionalidade de muitas das normas constantes nessa proposta de lei.
Nessa altura, o PS desferiu violentas críticas ao entendimento então conseguido na Comissão Permanente de Concertação Social, procurou fragilizar esse compromisso e exerceu fortes pressões públicas para condicionar a posição da UGT.
O PS assumiu, nesse processo, uma postura extremada, que rivalizou em radicalismo com o PCP e o BE, diabolizou o Código do Trabalho e apontou fantasmas e inconstitucionalidades a torto e a direito.
Foi nesse contexto que em 2005, no seu Programa de Governo, o PS prometeu aos portugueses que iria promover a revisão do Código do Trabalho “na base das propostas de alteração apresentadas na Assembleia da República em 2003”.
Mas o governo socialista ignora esse compromisso eleitoral, quer no documento de linhas gerais que apresentou em Abril passado na Concertação Social quer na proposta normativa que em Julho apresentou no Parlamento.
Recorda-se este facto, não para significar que concordamos ou discordamos com aquele compromisso do PS, mas apenas para demonstrar que também neste caso concreto das leis laborais, o PS prometeu aos portugueses uma coisa e faz outra, esqueceu as suas promessas eleitorais e dá o dito pelo não dito.
Invocam-se estes aspectos eminentemente políticos, porque legislar sobre as relações económico-laborais é um dos momentos altos do trabalho parlamentar e porque a coerência e a transparência políticas, que suportarem esta Proposta de Lei, são importantes para se perceber o rigor e a solidez da estratégia política de quem a apresenta e governa o País.
Ao contrário do PS, que só quando está no governo e lhe convém é que considera a Concertação Social um bom instrumento de diálogo e participação, os Social Democratas sempre valorizaram e valorizam o papel dos parceiros sociais, quer estejamos no governo ou na oposição.
Nesse sentido e sem prejuízo da última palavra caber à Assembleia da República, como órgão de soberania, encorajamos os esforços negociais das entidades sindicais e patronais em sede de concertação social, para convergirem num documento final equilibrado, que aperfeiçoasse as leis do trabalho e promovesse o crescimento económico e o emprego.
Foi também nesse sentido que manifestamos o nosso respeito pelos resultados finais dessa negociação e pela maturidade revelada por todos os parceiros sociais em sede de Concertação Social.
Constata-se agora, pela Proposta de Lei 216/X- Código do Trabalho, que o governo violou o acordo celebrado na concertação social, porque introduz alterações que não foram negociadas pelos parceiros sociais e omite propostas que tinham sido acordadas.
Estão no primeiro caso, a título de exemplo, a marcação do período de férias e encerramento da empresa para férias (artºs 240 e 241), mudança do trabalhador para categoria inferior (artº 119), cobrança de quotas sindicais (artº 456).
E no segundo caso, também como exemplo, é ignorada a possibilidade de se estabelecerem prazos diversos de vigência para cada matéria na convenção colectiva e, no que respeita à muito importante questão da “arbitragem necessária”, a proposta prevê que essa arbitragem não é automática, ao contrário do que foi acordado, mas fica dependente do despacho do Ministro do Trabalho que pode decidir da sua realização ou não.
É neste quadro que os TSD consideram que a proposta do governo sofre de graves desvios, face aos termos acordados na Comissão Permanente de Concertação Social, e exigem as consequentes alterações por parte da Assembleia da República.
Questões mais relevantes:
Princípios norteadores da Proposta
A Proposta de Lei 216/X é marcada pela filosofia, modelo de relações laborais e apoio à competitividade da nossa economia, na linha dos valores do actual Código do Trabalho, bem como pelo combate à precariedade das relações laborais, embora neste caso tenha ficado por tímidas alterações.
Esta revisão liberal não é globalmente favorável aos trabalhadores, porque desequilibra as relações laborais em favor das empresas.
Os TSD consideram ainda que não será pela revisão das leis do trabalho, pela política de baixos salários e pela fragilização do princípio da conciliação da vida profissional com a vida pessoal e familiar - como pode resultar da flexibilização da organização dos tempos do trabalho (seja através da adaptabilidade grupal, seja no âmbito dos bancos de horas ou horários concentrados) - que a economia portuguesa irá ser mais competitiva.
Duração do período experimental (artº 112)
Parece-nos excessivo o alargamento de 90 para 180 dias do período experimental para a generalidade dos trabalhadores, constituindo claramente um factor de agravamento da precariedade.
Também o alargamento de 180 para 240 dias no período experimental dos trabalhadores que exercem funções de direcção ou sejam quadros superiores é igualmente excessivo, considerando que os prazos actualmente em vigor parecem tempo suficiente para que as partes envolvidas possam avaliar do interesse ou não em manter o contrato de trabalho.
Mudança para categoria inferior (artº 119)
A mudança do trabalhador para categoria inferior sempre teve um carácter excepcional e isso mesmo é reconhecido na alínea e) do ponto 1. Artº 129.
Mas a redacção do artigo 119º da proposta retira à mudança para categoria inferior esse carácter de excepcionalidade, subtrai essa garantia ao trabalhador, exigindo o simples acordo individual que, sem a intervenção de entidade terceira, coloca o trabalhador numa posição de inferioridade negocial face à empresa.
Esta alteração não constava do Acordo com os Parceiros Sociais, pelo que a mudança para categoria inferior, mesmo não havendo diminuição de retribuição, não pode ficar ao arbítrio do empregador, porque lesiva do estatuto e dignidade profissionais do trabalhador, pelo que essa situação deve estar sempre condicionada à autorização dos serviços públicos competentes, como hoje acontece.
Bancos de Horas (artº 207º)
A proposta não prevê expressamente a utilização dos créditos de horas do banco no interesse do trabalhador. Também não é claro que, para evitar a redução de efectivos, o banco de horas só pode ser usado uma única vez, como ficou estabelecido no acordo em sede de concertação social.
Este novo mecanismo de adaptabilidade do tempo de trabalho é regulamentado por convenção colectiva, pelo que as condições do pagamento do trabalho acrescido ao período normal de trabalho também devem ficar devidamente clarificadas nesse IRCT.
Marcação do período de férias e encerramento da empresa ( artº 240, 241)
A proposta prevê que sempre que seja compatível com a natureza da actividade, o empregador pode encerrar a empresa ou o estabelecimento, total ou parcialmente, para férias dos trabalhadores.
Ou seja, se for compatível com a sua actividade, as empresas podem encerrar para férias pelo tempo que entenderem, entre 1 de Maio e 31 de Outubro, a não ser que o IRCT estabeleça período diferente.
Esta alteração, não prevista no acordo, é gravosa para os trabalhadores, porque constitui uma liberalização da marcação do período de férias, com fortes impactos na conciliação com a vida familiar.
Cobrança de quotas sindicais (artº 456)
A proposta prevê que o empregador deve decidir sobre o pedido do trabalhador no sentido do empregador proceder à cobrança e entrega das quotas sindicais, no prazo de 10 dias e, em caso de acordo, a data de produção de efeitos é estabelecida pelas duas partes.
Estamos em presença de um novo sistema de cobrança de quotas, que não foi objecto de negociação na concertação social, e que visa substituir a obrigação legal do empregador proceder à cobrança e envio das quotas para os sindicatos por um acordo a celebrar entre o trabalhador e empregador, por iniciativa daquele, cabendo ao empregador decidir.
Esta alteração colide com o disposto no artigo 403º da proposta, que consagra a autonomia e independência das organizações sindicais “face ao Estado, partidos políticos, instituições religiosas ou associações de outra natureza, sendo proibido qualquer ingerência destes na sua organização e gestão, bem como o seu recíproco financiamento”.
De facto, um sistema de quotas sindicais, como o proposto pelo governo, que fica dependente da existência de um acordo e cabendo à entidade patronal a última palavra, atenta claramente contra a autonomia e independência sindicais.
Arbitragem necessária (artº 509/510)
A proposta cria a figura da “arbitragem necessária”, com o objectivo de preencher o vazio contratual resultante da caducidade das convenções colectivas, a ocorrer se nos 12 meses seguintes à caducidade não tiver sido celebrada nova convenção colectiva e não existir outra que se aplique “a pelo menos 50% dos trabalhadores da mesma empresa, grupo de empresas ou sector de actividade”.
O que foi acordado na Concertação Social é que este mecanismo era automático, desde que suscitado por qualquer das partes.
Ora, a redacção da proposta prevê que a arbitragem necessária não é automática, ficando dependente do despacho do Ministro do Trabalho, que assim ficará com o poder pela sua realização ou não.
Esta violação, por parte do governo, do acordado em sede de concertação social, é totalmente inaceitável.
Ver também em TSD
Lisboa, 15 de Setembro de 2008
O Secretariado Executivo

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